Ritual de Lida

Abramo Machado

É hora sagrada pra lida de peão campeiro
A madrugada num suspiro de arremate
Pincho os recau no alvoroço do ovelheiro
E outro pucho pro cisqueiro na desencilha do mate


Um padre nosso antes do romper da aurora
Porque a memória guarda argum susto de doma
Mas também sabe que os sonhos que a alma escora
Moram na lida que aflora no alevianar da cambona


Ainda sinto o gosto do amargo na goela
Fazendo dueto com fumo de corda e falha buena
Cincha arrochada no estilo quebra-costela
E o sonido da barbela me inticando as nazarenas


É o velho jeito que um campeiro encilha o dia
Pingo de aguente e cusco bueno pra empreitada
Se ergue o poncho e aperta o mate ainda no escuro
E o angico empeca susurros fazendo pouco da geada


No fim da tarde, espicho a vista no horizonte
E na minha sombra que se alonga pelo chão
Cruzo a guapeada, pero, um buenas nunca basta
E um choro de espora arrasta o cotovelo pro balcão


Mas lembro a linda virando o mate da volta
E uma saudade dentro ao peito me judia
Então me aprumo que esta saudade não solta
E o ovelheiro faz a escolta pras desencilhas do dia


É o velho jeito que um campeiro encilha o dia
Pingo de aguente e cusco bueno pra empreitada
De tardezita, uma apeada na pulperia
Dois gole e uma parceria pra prosear das campereadas

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