Canção do Africano
Lá na úmida senzala
Sentado na estreita sala
Junto o braseiro, no chão
Entoa o escravo o seu canto
E ao cantar correm-lhe em pranto
Saudades do seu torrão
De um lado, uma negra escrava
Os olhos no filho crava
Que tem no colo a embalar
E à meia voz lá responde
Ao canto, e o filhinho esconde
Talvez, pra não o escutar
Minha terra é lá bem longe
Das bandas de onde o Sol vem
Esta terra é mais bonita
Mas à outra eu quero bem
O Sol faz lá tudo em fogo
Faz em brasa toda a areia
Ninguém sabe como é belo
Ver de tarde a papa-ceia!
Aquelas terras tão grandes
Tão compridas como o mar
Com suas poucas palmeiras
Dão vontade de pensar
Lá todos vivem felizes
Todos dançam no terreiro
A gente lá não se vende
Como aqui, só por dinheiro
O escravo calou a fala
Porque na úmida sala
O fogo estava a apagar
E a escrava acabou seu canto
Pra não acordar com o pranto
O seu filhinho a sonhar!
O escravo então foi deitar-se
Pois tinha de levantar-se
Bem antes do Sol nascer
E se tardasse, coitado
Teria de ser surrado
Pois bastava escravo ser
Minha terra é lá bem longe
Das bandas de onde o Sol vem
Esta terra é mais bonita
Mas à outra eu quero bem!
O Sol faz lá tudo em fogo
Faz em brasa toda a areia
Ninguém sabe como é belo
Ver de tarde a papa-ceia!
Aquelas terras tão grandes
Tão compridas como o mar
Com suas poucas palmeiras
Dão vontade de pensar
Lá todos vivem felizes
Todos dançam no terreiro
A gente lá não se vende
Como aqui, só por dinheiro