Platoon
Mal a noite se foi, cornetas anunciam a alvorada
Nas camas de campana o dia nasce em hora errada
No nosso acampamento sobraram poucas luzes
Na espera das famílias, voltaram muitas cruzes
Entre mentiras e mártires, trincheiras e arames
Casas desabam como lagrimas e o aço voa como enxame
Medalhas e caixões, horas são os últimos minutos
Em utopias românticas as flores se fecham em luto
Virtudes se perdem, voz trêmula, coração frágil
Na guilhotina sorriso do carrasco é mal pressagio
Somos sombras vivas de uniforme e fuzil
Crepúsculos surgem no céu, estamos onde Lúcifer caiu
Excitação e pavor, feridas vermelho carmim
Decoro detalhes dos instantes enquanto diabos zombam de mim
Um céu sem Deus, só artilharia anti aérea
Entre os meus melancolia contamina igual doença venérea
Enterramos os mortos em covas rasas e armas na mão
Caso os anjos se neguem a lhes abrir o portão
Um pelotão de beijos e promessas deixados no ar
Dizimados por certezas de amanhãs sem chegar
Passo as noites no bar do limbo, comemoro a vida como um prêmio
Na guerra, o sereno protege os passos dos boêmios
Cantamos hinos e parodias banhadas a rum
Sobre esperanças despedaçadas e Djavus de Platoon
Quero amores de cabaré, caricias vãs pela manhã
Mas em amarras de rancor meu coração é o Vietnã
Nossa cruz é pesada demais
Carrego a dor da mãe dos meus inimigos na forma de funerais
Somos filhos da insegurança a mando da ambição
Uma muralha de orgulho e um deserto de solidão
Em boas novas, nunca, apenas cálculos mal traçados
Na nossa frente um mar de ódio na forma de solitários e assustados
Perdidos iguais a nós, anti cristos da mesma trama
Sons de lições mortas são ecos de corpos tombando na lama
Nem sendas nem atalhos, só uma tristeza fria
Essa é a marcha dos soldados que não vão ver o nascer de um outro dia
Dizer adeus é uma arte, lembro de acenos, despedidas
Na viagem nutrimos um ódio fruto de uma fé falida
Capelas destruídas, sinos soturnos a sós
Contradições que caminham perguntam, Deus esqueceu de nós?
Padres nos dão a extrema unção, sou jovem demais pra morrer
Palavras se esfarelam no ar em frases sem dizer
Estigmaras nascem de dias lentos
Herói de guerra são frustrações batizadas no dia do nascimento
Enquanto o tempo escorre e assopra amores fracos
Viramos fotos 3 por 4 em livros amarelados e opacos
Brisas trazem recordações, meu general fala, eu concordo
Somos lindas ilusões em olhares de solidão que vieram a bordo
Sem tardes a beira mar, sem afago, sem passado
Nuvens cinzas invadem o céu, querubins ficam calados
Aviões cobrem o sol, projeteis furam a couraça
Transformando o navio e meus companheiros em carcaça
Cheiro de pólvora, enxofre, dor, devaneio
O mar tem gosto de amnesia, a água cheiro de eu te odeio
Queria tâmaras e damascos, decks de piscina
Mas sou um recado do tempo anestesiado de morfina
Numa neblina densa a respiração é dolorida
Vejo bruxas disputarem a atenção de corpos já sem vida
Gosto metálico na boca, agora é difícil raciocinar
Desculpa mãe, teu filho é herói e não vai mais voltar
Sinto a roupa grudar no corpo, agora sou eu e minha fé
O tempo não faz barulho porque a morte caminha na ponta dos pés
Fim do ato, câmera lenta, deitado tento pensar
Ouço vozes vindas do breu e sinto meu mundo se apagar